Voltar ao início

      Crônica:                           "O Homem diante do Universo"

                                                                                                           Celso Piza Pimentel

Todo o conhecimento dá e tira ao mesmo tempo: quando, há muito tempo atrás, ADÃO comeu o FRUTO PROIBIDO, CONHECEU que estava nu e PERDEU o paraíso do ÉDEN.

Assim, o homem, aos poucos, descobriu os céus, as estrelas, os mundos. E, aos poucos foi perdendo a segurança de uma terra toda ao seu inteiro dispor, com um sol rolando no céu a iluminar o mundo para ele.

Sim, o homem descobriu que seu mundo é uma bolinha insignificante, um pó rodopiando num universo imenso e silencioso. E, como num pesadelo, se vê girando solitário, no meio do espaço.           

"Bem, bem..., a Terra nada é: é mínima, direis, mas, e o Sol? Astro radioso, estrela diurna do nosso mundo. Sim, e o Sol?"

''O Sol? Oh! Não passa de uma faísca mínima no universo" responde o homem do guarda-pó branco, mostrando uma daquelas fotografias onde as estrelas aparecem como farinha no fundo escuro. "O Sol? Procura aqui o teu Sol! Não o acharás nunca.

Aterrados, olhamos. Raramente nos sentimos tão perdidos como neste momento: como as crianças em tempo de tempestade, temos vontade de puxar a coberta sobre as nossas cabeças e nos esconder dentro de nós mesmos, sem ver nada destes números, fotos, contas e fórmulas secos e feios e que - que horror! - estão certos! Fechando os olhos, lembramo-nos do tempo em que a sala de visitas era o mundo, a árvore de Natal era o próprio esplendor, e galopávamos num cabo de vassoura, felizes na nossa fantasia. Mas, "afinal, adormecemos...

Quando acordamos, o Sol já vai alto no céu. Como é belo o mundo!

Aí está a Terra, esplendorosa, com seus segredos e mistérios.

No campo, por entre flores multicores, revoam as borboletas. No bosque cantam pássaros de "além da imaginação". No fim da mata, eis o veado que, depois de conceder um olhar ao mundo, afunda na selva. Na montanha, a neve cega e, nas cavernas, brilham os tesouros dos gnomos. No fundo do mar, o polvo e o tubarão travam luta de morte. Os peixes de conto de fada brilham em suas roupagens, como se estivessem prontos para ir a algum baile.

Eis a terra! Será ela um nada? Será que ela é uma nulidade?

Não! Em lugar algum há pedra mais bela que o diamante. Em lugar algum as nuvens andam no céu, sem rumo, a brincar com o vento.

A Terra pode ser um nada no Universo. Mas é TODO o UNIVERSO no nada.

Olhai o céu hoje á noite. E pensai, sem vos sentirdes nem um pouco diminuídos, nos mil milhões de galáxias que voam no espaço negro, lá em cima.

E pensai , também, que, aqui, na Terra, há algo que é, sem dúvida, tão grande como o Universo: o homem, que pode se tornar no Universo.

Sim, o homem é uma criatura singular. Todos os vertebrados são dotados de cérebro, mas o do homem não sofre confronto. O mundo moral é coisa especificamente humana. Não se pode admitir que o uivo lamentoso da macaca à vista do filho morto, seja sequer o princípio da nobilização da dor de:" Oh! Vede! Choram os deuses, choram todas as deusas, porque o belo passa...". Embora o gibão possa solfejar uma escala, não existe nele nada, absolutamente nada do germe de uma futura "Nona Sinfonia" ou "As Quatro Estações". A ave enamorada oferece à amada uma pena colorida, mas jamais despontaria nela a idéia de simbolizar o "Pensador" ou a "Piedade". Nós temos o direito de apontar o "Decálogo", o "Sermão da Montanha", a "Declaração dos Direitos Humanos" como atestados honrosos do pensamento e arte  humanos.

Mas, ai de nós! - a natureza humana não é só grandeza. Há nela obscuras sensações animalescas.

Oh! Que caricatura!

Os gregos antigos simbolizaram o homem com suas duas naturezas pelo centauro - em cima, herói, embaixo, cavalgadura; e a mulher pela sereia, com lábios que cantam , mas mãos com garras de abutre.

Mas, afinal, o que é o homem?

Nenhum outro ser ergue os olhos para o céu e diz, de si para si: "Duas coisas me enchem a alma de admiração e reverência, tanto maiores quanto mais e mais a reflexão se concentrar nelas: o céu estrelado acima de mim e a lei moral dentro de mim". Nenhum outro ser terrestre sonda o passado e propõe ao futuro as eternas perguntas:"Donde?", "Para onde?", "Para quê?", "Por quê?" Criatura conhecida alguma sabe calcular os ínfimos átomos e as imensas distâncias do Universo. Ele é o sacerdote, para quem o mundo é um templo grandioso e onde o sacrifício é o culto do enigma cada vez mais revelado,  mas cada vez mais obscuro, pelo qual, no qual e para o qual ele foi criado: a Natureza. 

 

Esoterismo