Esoterismo

 
"Reflexões sobre EDUCAÇÃO 2"
Palestra

Zélia de Toledo Piza

Desde 1.920 que se cogita de uma reformulação do ensino. A queixa no início do século XX era a de que se educava exclusivamente para o indivíduo participar da vida política, dando seu voto e não havia um plano pedagógico para o ensino.
Após grandes lutas como as de Sampaio Dória em S. Paulo, em 1.920, e Anísio Teixeira na Bahia, em 1.925, algumas de suas proposições vêm se firmando, vagarosamente, paulatinamente. Defendiam, por exemplo - "Os programas devem ser elaborados tendo em vista não a quantidade de noções e conhecimentos, mas a sua qualidade de acordo com o uso que possam ter na vida. Os programas devem ser organizados em torno dos centros de interesse." Aliás, Decroly teve muita influência sobre o pensamento educacional no Brasil, mas só em termos de idéia.
Quer dizer que nossos patrícios já defendiam as idéias dos grandes pensadores internacionais que faziam a passagem do século XIX para o XX, como Decroly e Dewey , mas tudo não passou de defesa das idéias porque nada se objetivou.
É interessante nós observarmos que, de acordo com as necessidades da época, vão surgindo os pensadores que trazem a nova tônica. Existem, hoje, inúmeras proposições de educadores contemporâneos que buscam restabelecer o humanismo dentro da educação. Humanismo no sentido de se considerar o ser humano como objeto da educação.
O ser humano volta a ser colocado como fulcro da educação, deslocando-se o fator cultural para o seu devido lugar. A tendência atual dos pensadores, ainda no plano das idéias, é o de conseguir-se a formação do indivíduo - a cultura seria apenas um meio para se alcançar o verdadeiro objetivo que é a formação integral do homem. A maneira de se transmitir os conceitos teria sempre como fim a organização interna, o despertamento das potencialidades.
A Lei Nacional do ensino, a 5.692, é por excelência humanista. Entre outros itens, propõe:
Desenvolvimento das potencialidades do ser como elemento de auto-realização.
Desenvolvimento integral da personalidade.
Pois bem, o que se entende por personalidade, por potencialidades?
Do ponto de vista psico-pedagógico, personalidade é toda essa organização interior constituída pelas várias áreas do nosso sistema de reação. Temos vários departamentos internos e é justamente a dinâmica entre essas áreas, a circulação livre entre todas elas é que possibilita ao indivíduo interagir adequadamente dentro do meio ambiente.
Quais seriam, então, essas áreas, essas dimensões da pessoa humana e que precisam ser despertadas? Podemos continuar nos apoiando na Lei. O parecer 1/72 da Câmara do Conselho Estadual de Educação enumera essas áreas:
1. Área física e motora
2. Área cognitiva ou intelectiva
3. Área afetivo-emocional. Aqui cabe uma observação. A separação entre a cognição e a emoção é apenas didática, pois na verdade estão completamente interligadas, tanto que o estado emocional altera o desempenho mental.
4. Área moral
§ conhecimento das normas das ações humanas, dos valores morais e da sua hierarquização;
§ desenvolvimento da habilidade de discernir entre o certo e o errado;
§ desenvolvimento da habilidade de auto-determinar-se;
§ desenvolvimento de hábitos de opção livre e responsável;
§ desenvolvimento da atitude crítica diante dos valores culturais.
5. Área social - reciprocidade de relacionamento - o bem comum.
6. Área cívica.
7. Área profissional - visando despertar aptidões para o exercício efetivo de uma profissão, independência econômica, valorização do trabalho como imperativo econômico e moral.
8. Área religiosa:
- conhecimento da expressão religiosa dentro das diversas culturas;
- desenvolvimento de atitude de procurar além do contingente a existência das coisas;
- desenvolvimento de hábito do viver coerente com princípios adotados;
- desenvolvimento do hábito e da valorização da vida interior.

Vamos ver no que se constitui cada uma dessas dimensões e como podem ser trabalhadas.

1. Dimensão física e motora:
Este aspecto pressupõe um bom funcionamento orgânico e, portanto, atividades que levem a isso - boa alimentação, exercícios, ar livre; incorporado ao físico, estão as percepções, ligadas aos sentidos, e que estabelecem o relacionamento com o meio ambiente. Existe toda uma seqüência prática e objetiva, apresentada por Maria Montessori.
A parte motora deve ser trabalhada através da psicomotricidade, atividade extremamente importante - é o ser em relação a si mesmo e aos elementos que o cercam. É necessária uma seqüência por faixa etária. Nessa relação entre a criança e o ambiente, com o intuito de adaptar suas atividades à vida real, existe uma proposta de Maria Montessori que se chama Vida Prática. Coloca a criança em contato com atividades da vida diária, como sentar e levantar de uma cadeira, como abrir e fechar uma porta; como transportar objetos e vai dando o controle dos movimentos. Coloca em contato com os meios de transporte, comunicação, profissão dos Pais e parentes. Há todo um treino para o convívio social - cumprimentar, pedir desculpas, com licença etc.
Hoje se fala muito nas técnicas orientais de defesa. Não seria difícil introduzir o Taichi, que é uma técnica de defesa, mas que sobretudo movimenta as energias e transmite princípios éticos.

2. Área cognitiva, mental;
§ Criatividade é um fator básico.
§ Espírito crítico, que deve ser treinado desde quando a criança está no Jardim da Infância. Gostou? Sim, não, por quê?
§ Exercícios para desenvolver a mente matemática. Existem materiais específicos - como os Blocos Lógicos em suas séries de exercícios; a série de materiais Montessorianos, cientificamente preparados para que a criança passe pela experiência da descoberta do conhecimento. Treino da atenção, observação, concentração e raciocínio. Estes aspectos não são treinados, mas podem ser através de materiais e jogos, bem como de experiências científicas.
§ Desenvolver o raciocínio ou pensamento analógico. Pode-se fazer isto desde cedo, através da análise de semelhanças e diferenças entre estórias.
§ Trabalhar situações problemas para desenvolver o raciocínio e a capacidade de adaptação. Ex. O que aconteceria se deixasse a janela aberta durante uma tempestade? Justifique a resposta. Qual a melhor maneira de se passar estes blocos para o canto oposto da sala? Justifique. O que você faria se fosse Pai, ou Mãe?
§ Desenvolver o raciocínio, evitando conjecturas.
Mostrar a figura de um animal e mandar descrever. Se ninguém falar nada subjetivo, perguntar - Está com fome? Está cansado? Levar a criança a perceber que é impossível saber.
Mostrar duas vasilhas com formas diferentes contendo água. Perguntar se têm a mesma quantidade? Só medindo. Mostrar o lado bom de uma maçã estragada e perguntar se é boa. Se disserem que é, perguntar como podem ter a certeza? Só examinando toda a maçã.
§ Fazer coleta e organização de dados - levantar regras dos jogos.
§ Perguntar ao Pai como é seu trabalho e contar aos colegas.
§ Fazer lista do que seria necessário levar para um piquenique ou para fazer uma festa de aniversário.
§ Ensinar a levantar hipóteses: digamos, um brinquedo largado fora do lugar. Hipótese certa só se alguém tivesse visto. Hipóteses - é possível que tenha caído. Quem sabe alguém usou e esqueceu etc.
§ Na dimensão intelectual temos Piaget desvendando a estruturação da mente.
§ Está sendo organizado pelo grupo de estudos em educação, um programa de filosofia para criança, que tem por objetivo levar a criança a pensar - a questionar, a comparar. O professor não faz colocações nem responde a perguntas, mas incita a criança a formular suas questões.

3. e 4. Áreas afetivo-emocional e moral.
Inúmeros pensadores, entre eles, Maria Helena Novaes, têm focalizado a capacidade de amar o outro. Esta autora analisa detidamente a premissa: só é capaz de dar amor, aquele que recebeu amor. Focalizar a Lei de Causalidade tão bem tratada por Piaget. A compreensão da Lei de Causa e Efeito se constitui num dos fundamentos da moral. Porque não é o ato em si que é amoral, mas o efeito que produz dentro da coletividade.
Este é o aspecto formativo, onde se encontra o treino da Vontade. É impossível separar estas áreas, uma vez que a formação do caráter exige controle da emoção.
O autocontrole é desenvolvido na Linha, técnica Montessoriana. Nessa técnica a criança percebe que pode mandar em si mesma.
Disciplina, respeito à hierarquia, exigem uma abordagem à parte.
Auto-afirmação, autoconfiança, independência, auto-estima, auto-conceito. O auto-conceito seria aquele conjunto de expectativas que o indivíduo tem de si mesmo nas diferentes experiências da vida, expectativas essas que vão se confirmando através da experiência social. Todos os valores da natureza humana se organizam em um único sistema, cujo núcleo é a avaliação que o indivíduo faz de si mesmo. Existem abordagens à parte, inclusive de Rogers, intimamente relacionadas às influências sociais e familiares. Estas abordagens fariam parte de um enfoque das influências do contexto social e familiar sobre a criança
O equilíbrio emocional pode ser trabalhado também através das artes, pintura, música, dramatização. Técnicas de expressão corporal que levam o homem a retomar o sentido de si mesmo. A Antroposofia com os exercícios de euritmia, que é a arte do movimento, através dos quais se tornam visíveis por meio do movimento do corpo, os conteúdos mais profundos inerentes à palavra e à música.
Nesta área, precisamos fazer renascer os contos, que estão completamente relegados e que alimentam a vida emocional. Os contos, as fábulas, as lendas, a mitologia apresentam arquétipos que florescem na mente do indivíduo. Exaltam emoções positivas como a fraternidade, a sensibilidade, a solidariedade, o altruísmo e também levam a vivenciar emoções negativas que trazemos dentro - vaidade, egoísmo, esperteza que podem ser percebidas como válidas ou não. O teor das estórias esclarecem o princípio de causa e efeito resultante dessas emoções, isto é, a criança percebe que o certo traz efeitos mais desejáveis. Além disso, trabalha-se a imaginação da criança o que é um caminho para o desenvolvimento da criatividade. Nem todas as estórias devem ser acompanhadas das figuras, porque, assim, a criança pode criar algo mais próximo da realidade vivencial dela.
Neste aspecto - criatividade - a criança recebe demais brinquedos prontos, que já têm uma forma pré-estabelecida para se lidar com eles. Isso não estimula a capacidade criativa da criança. Pode-se, por exemplo, fazer uma boneca de um guardanapo dobrado e comparar uma boneca finíssima. Na do guardanapo, ela deverá acrescentar, pela fantasia, o que falta para se parecer com a figura humana e isto estimula a criatividade.

5. Dimensão social
Visando hábitos de relacionamento inter-pessoal, de cooperação, através de jogos de equipe. Cuidar de mostrar a valorização do outro.

6. Dimensão cívica
Levando a criança a conhecer a realidade nacional, a desenvolver hábitos que a capacitem ao exercício da cidadania democrática.

7. Dimensão profissional
Procurando apresentar de forma a mais concreta possível, os vários tipos de atividades, de forma a despertar aptidões para o exercício efetivo de uma profissão.

8. Dimensão espiritual
A Lei não usa a palavra espiritual, mas "Dimensão Religiosa", porém, as premissas são colocadas com amplitude de visão, com ecletismo conforme vimos no texto. A interiorização pode ser conseguida através daquela mesma técnica Montessoriana chamada Linha. Ela apresenta a Lição do Silêncio e muitas concentrações podem ser acrescentadas, como mentalizar símbolos, pomba, taça, um mandala etc.
Pois bem, uma educação plena deverá necessariamente abranger todas essas áreas, que formam um complexo indissolúvel e que precisam ser consideradas como um contexto uno. O homem integral precisa desenvolver-se paralelamente em todas as suas dimensões.
Analisando as proposições dos pensadores contemporâneos, encontramos colocações específicas e extremamente válidas para que seja realizado um trabalho dentro de cada uma dessas dimensões, levando o aluno a funcionar de dentro para fora, conforme proposta de Sócrates.
É o atendimento a todas essas áreas, de forma específica e ao mesmo tempo em que interligadas entre si, bem como o aproveitamento de todas as proposições educacionais construtivas formando uma metodologia global, que se pode caracterizar como uma educação Holística.
Se no campo das idéias temos todos os elementos para uma educação integral, então, por que a verdadeira educação não é uma realidade?
Para chegarmos à educação de uma nova era, precisamos partir da nossa realidade. Precisamos pesquisar, dentro dessa realidade, quais são os entraves e removê-los.
O importante é que as premissas para uma educação ideal estão aí. Falta agora, nós adultos, nos tornarmos capazes de objetivá-las.
E dessa forma, estaremos colaborando para o surgimento da Nova Era, a Idade de Ouro, quando haverá harmonia e felicidade sobre a face da terra.

 

 

 

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