Para compreender Jesus, historicamente, seria preciso analisar alguns pontos: a situação do mundo àquela época, ou seja, o declínio do Império Romano, com todas as suas tiranias; analisar a sua doutrina e seu modo de vida e ver que possibilidades havia de um ajustamento entre o que ele pregava e o que pensava o povo de Roma; conhecer pelo menos cinco dos principais movimentos da época, quatro dos quais disputavam entre si a herança de Moisés.
Quem eram os Samaritanos, os Fariseus, os Saduceus e os Zelotes? Quem eram os Essênios aos quais a Bíblia não faz referência, mas que é mencionado em outros textos da época?
Conforme vimos pelos relatos históricos, em 722 a.C.:, ao tempo de Sargão II, rei Assírio, as 10 tribos de Israel, cuja população se encontrava nas proximidades da Samária[1], foram desterradas e substituídas por colonos Assírios, que se constituíram nos ascendentes dos Samaritanos da época de Jesus.
Eles conservaram a religião e a tradição dos assírios durante 400 anos, ou seja, até 331 a.C., quando Alexandre, o Grande, surge na história. Dessa época em diante, foram se tornando Iavehistas, ou seja, passaram a aceitar o Jeová dos judeus e, conseqüentemente, a aceitar o Pentateuco como canônico. Devemos esclarecer, todavia, que aceitavam uma versão hebraica que apresentava alterações em relação à versão judaica, particularmente na especificação de qual dos templos deveria ser o oficial - o de Gerizim na Samária ou o de Sião em Jerusalém[2].
Apesar de todos os seus antecedentes históricos, os samaritanos pretendiam ser descendentes diretos das 10 tribos e possuidores da religião ortodoxa de Moisés e consideravam o sacerdócio dos judeus como cismático. Para eles, samaritanos, o verdadeiro santuário não era o construído sobre o monte Sião, ou Zion, onde está o templo de Jerusalém, mas sim o que está sobre o monte Gerizim, na Samária.
Na verdade, existe na Bíblia referência aos montes da Samária como local onde, por ordem de Moisés, seriam colocadas e caiadas as primeiras pedras. Lemos em Deuteronômio 27:4 - "Levantareis sobre o monte Ebal grandes pedras, que caiareis com cal e nelas escrevereis as palavras da Lei". O cumprimento dessa ordem lemos em Josué 8:30: "Então Josué edificou um altar ao Senhor Deus de Israel no monte Ebal". E no versículo 32: "Também escreveu em pedras uma cópia da lei de Moisés". Nestes textos, os samaritanos trocam a palavra Ebal por Gerizim.
Em Deuteronômio 27:12, aparece o nome Gerizim, mas não para construção do templo: "E sobre o monte Gerizim" - que fica um pouco ao sul da cidade de Sichem, na Samária - "estarão Simeão, Levi, Judá, Issacar, José e Benjamim para abençoar. E sobre o monte Ebal" - que fica um pouco ao norte de Sichem - "estarão Rúben, Gad, Aser, Zebulon, Dan e Naftali para amaldiçoar". Além de identificar em que termos aparece o nome Gerizim, podemos verificar aí a descrição de uma polaridade que nunca foi entendida.
Acontece, porém, que a Davi é que foi dada a ordem para construção do templo. I Reis 5:5: "E eis que eu, Salomão, intento edificar uma casa ao nome do Senhor meu Deus, como falou o Senhor a David, meu pai, dizendo: Teu filho que porei em teu lugar no teu trono, ele edificará uma casa ao meu nome".
Os samaritanos fundam sinagogas, criam uma teologia, uma tradição exegética que vem anexada ao Targum Samaritano, versão aramaica do Pentateuco.
Os samaritanos eram considerados pelos judeus como gentios, por causa da raça e religião. Chamar alguém de samaritano era injúria; essa palavra era expressão de escárnio e desprezo.
Por sua vez, os samaritanos votavam ódio aos judeus, tanto assim que Jesus não pôde, em sua última viagem, seguir direto de Capharnaum para Jerusalém, mas precisou contornar pelos confins do Jordão, entrando por Jericó. São Lucas 9:51.
Essa não aceitação do judeu pelo samaritano vemos naquela passagem registrada em São João 4:10, quando uma mulher samaritana diz a Jesus: "Como sendo tu judeu me pedes de beber a mim que sou samaritana?" Ao que Jesus responde: "Se tu souberas quem te pede de beber, tu lhe pedirias a ele e ele te daria da água da vida".
Conhecendo-se estes antecedentes, compreende-se melhor a profunda extensão da parábola do bom samaritano, porque Jesus transforma uma palavra de ódio numa idéia prática de amor ao próximo. São Lucas 10:25: "E eis que se levantou um certo doutor da lei, tentando-o dizendo: Mestre, que farei para herdar a vida eterna? E Ele lhe disse: Que está escrito na Lei? E, respondendo, o doutor disse: Amarás ao Senhor teu Deus de todo o teu coração e de toda a tua alma, e de todas as tuas forças e de todo o teu entendimento e ao teu próximo como a ti mesmo. Jesus disse: Respondeste bem, faze isso e viverás. Ele, porém, querendo justificar-se a si mesmo, disse a Jesus: E quem é o meu próximo? E respondendo Jesus disse: Descia um homem de Jerusalém para Jericó, e caiu nas mãos dos salteadores, os quais o despojaram e espancando-o, se retiraram, deixando-o meio morto. E, ocasionalmente, descia pelo mesmo caminho certo sacerdote; e vendo-o, passou de largo. E de igual modo também um levita, chegando àquele lugar, e vendo-o, passou de largo. Mas um samaritano, que ia de viagem, chegou ao pé dele e, vendo-o, moveu-se de intima compaixão; e, aproximando-se, atou-lhe as feridas, deitando-lhe azeite e vinho; e pondo-o sobre a sua cavalgadura levou-o para uma estalagem, e cuidou dele; e, partindo ao outro dia, tirou dois dinheiros e deu-os ao hospedeiro e disse-lhe: cuida dele, e tudo o que de mais gastares eu to pagarei quando voltar. Qual, pois, destes três te parece que foi o próximo daquele que caiu nas mãos dos salteadores? E ele disse: O que usou de misericórdia para com ele. Disse, pois, Jesus: Vai e faze da mesma maneira".
Nesta parábola, como em todas as outras, está registrado o padrão do ciclo da era de Piscis - compreensão, solidariedade, união. Olhando a humanidade, verificamos quão longe ela está desse padrão e, no entanto, estamos finalizando esta era para dar início à era de Aquário quando, então, receberemos novo padrão de comportamento.
Fariseu provém da palavra hebraica "Perishin" que significa "os segregados, os expulsos". Isto porque durante o domínio Persa, pós-exílio, os Sacerdotes é que ensinavam nas escolas e, nessa ocasião, os fariseus estavam ligados ao sacerdócio. Depois, quando começaram surgindo leigos preparados e que eram designados para o ensino, os fariseus foram proibidos de ensinar, portanto, expulsos.
Esta seita é mencionada por Josephus e diz ele que estiveram em atividade durante três séculos, de 135 a.C. até 135 d.C. Ao tempo de Jesus, havia mais ou menos seis mil homens. Este grupo nasceu de um partido chamado Hassidim que, ao tempo dos Macabeus, lutava contra as influências Helenizantes.
Sua maior preocupação era tornar a Torá, a Lei Mosaica, aceita como regra de vida pelos judeus, pois acreditavam em sua origem espiritual. Estavam constantemente engendrando argumentos para ligar os costumes populares com o texto escrito do Pentateuco e, com isso, desenvolveram um sistema engenhoso de exegese, palavra que significa comentário para esclarecimento de um texto ou de um termo. Procuravam, ardilosamente, harmonizar as contradições aparentes entre a Lei de Moisés e a dos Profetas. Esse trabalho resultou numa extensa e valiosa literatura hermenêutica, palavra que se refere à arte de interpretar a Lei.
Para alcançar seus objetivos, fundaram as sinagogas e, em reuniões semanais, os livros sagrados eram lidos e explicados ao povo.
Eram chefes do partido democrático e dominavam a situação política. Tinham patriotismo exaltado, com rasgos de heroísmo.
Estavam divididos em inúmeras seitas sendo que a maioria delas vivia com grande luxo e buscava o poder. As censuras feitas por Jesus são dirigidas não ao partido como um todo, mas particularmente à seita dos Shammai que se preocupavam, mais do que os outros, com o formalismo e a hipocrisia. Acreditavam que essa transformação que se deve operar dentro do homem, esse estado de verdadeira mística, podia ser comprado através de ritos, práticas, jejum, penitências públicas e guarda do sábado. Percorriam as ruas com a cara coberta de cinza, orando alto, dando esmolas nas esquinas etc.
Os fariseus queriam converter os pagãos. Não admira que São Paulo, de origem pagã, passasse pelo farisaísmo.
As relações entre Jesus e os fariseus primitivos, digamos, com o tronco do farisaísmo, apresenta alguns pontos curiosos:
- Esta seita compreendia a maioria dos leigos eruditos, que se chamavam "escribas ou doutores da lei" e os que possuíam o título de Rabino[3] por serem mestres designados como membros do Sinédrio[4]. Esses elementos eram recrutados entre a burguesia e na classe artesanal e Jesus pertencia a essa classe.
- Além de terem representantes no Sinédrio, tinham grande influência nas sinagogas, sendo que Jesus tinha acesso livre para pregar nelas.
- Muitos de entre os doutores da lei exerciam uma profissão manual para manter-se, dai o fato de Jesus ser carpinteiro inserir-se no contexto social da época.
- Um dos grandes Rabinos fariseus do primeiro século a.C. resumiu sua doutrina da seguinte forma: "Aquilo que não queres que te façam, não o faças a outro. Esta é toda a Lei e o resto é apenas comentário". Estas mesmas palavras aparecem nos lábios de Jesus como um mandamento: "Tudo o que quereis que os outros vos façam, fazei também vós a eles, porque esta é a Lei dos Profetas".
- É de se notar que os saduceus, os samaritanos e a casta sacerdotal perseguiram os cristãos, mas os fariseus que pertenciam ao tronco do farisaísmo, estavam sempre ao lado deles.
A principal diferença entre os grupos daquela época baseava-se na interpretação da Torá. Os fariseus acreditavam na existência de uma lei oral que havia sido transmitida por Moisés diretamente aos sacerdotes. Seu Messias não é figura transcendental mas filho humano da linhagem de Davi. Acreditavam na imortalidade da alma, nos anjos e na reencarnação.
Saduceu vem da palavra Zadokites que quer dizer adeptos dos filhos de Zadok. Zadok foi Sumo Sacerdote do templo de Salomão e os saduceus se diziam descendentes diretos dele e disputavam o sacerdócio por direito de herança. I Reis 1:34.
Não eram nada organizados. Recrutavam seus membros entre os aristocratas e Jesus era pobre. Eram mundanos, indivíduos de vida fácil, interessados em posições, privilégios, mais políticos do que religiosos. Sua única fé era superioridade e poder. Admitiam certa helenização da Judéia, por isso, os romanos muito se apoiaram neles.
Eram um grupo conservantista que só aceitava como regra a lei escrita, sendo que interpretavam tudo ao pé da letra. Não acreditavam na revelação oral.
Demonstravam abertamente que eram contra as crenças dos fariseus e, inclusive, zombavam deles acintosamente. Rejeitavam as tradições antigas, como por exemplo, a sobrevivência da alma e a ressurreição. Diziam que o Sepher não dizia nada de positivo sobre esse assunto. Alma era atributo do corpo e passageiro como ele.
Não aceitavam o Messias como filho do homem, da linhagem de Davi; esperavam um Messias Sacerdotal que, por semelhança com Melchisedech, teria o nome de Zadok.
Após a destruição do Templo de Jerusalém em 70 a.C., realizada por Tito, imperador romano, episódio em que os, judeus demonstraram coragem indescritível, entrincheirando-se dentro do próprio templo e resistindo até à morte, os saduceus desaparecem da história. Nunca mais foram citados por ninguém.
Segundo Josephus, sua origem data do ano 6 d.C como reação dos judeus contra o recenseamento imposto pelo legado sírio, Publio Sulpício Quirino, enviado pelo imperador Augusto. Josephus considerava os zelotes como a quarta filosofia, sendo as três anteriores - essênios, saduceus e fariseus.
A organização foi fundada por Judas, o Galileu, com a ajuda de um sacerdote fariseu de nome Zadoque e mantiveram a rebelião até o ano 70 d.C.
Era uma seita e partido político judaico, constituída pela ala radical dos fariseus, e sua teologia afirmava que Deus era o único dirigente da nação e que o reinado do Messias se estabeleceria pela força. Assim, lutaram não só contra os romanos, mas também contra os judeus que aceitavam a dominação romana.
Seus adeptos eram numerosos e incluíam elementos de todas as camadas sociais, inclusive as mais elevadas. Para esse partido afluíam fanáticos e rebeldes que reclamavam a supressão do domínio estrangeiro.
Eram perversos e, portanto, se tornaram odiados e temidos tanto pelos judeus quanto pelos romanos.
Josephus menciona que os zelotes estariam associados aos sicários. Sicários vem da palavra latina "sicas" que descreve um instrumento constituído de lâmina curta em forma de foice, arma empregada pelos romanos.
Os sicários eram terroristas frios e, sem a menor razão, durante qualquer aglomeração, apunhalavam pessoas com suas adagas. Hipócitas, após perpetrar o crime, juntavam-se aos que protestavam indignados. Com isso, geraram um clima insustentável de terror, onde ninguém confiava em mais ninguém.
Os zelotes acreditavam que defendiam o culto de Yahweh, ou Javé, e que haviam de implantá-lo fosse por bem ou por mal. Alimentavam o sonho de criar uma sociedade racista para dominação do mundo. Pensavam obter isso através da subversão do povo à autoridade estrangeira, criando uma nova ordem com o dedo de Deus.
Chegaram a dominar parte de Jerusalém mas, com o cerco da cidade pelo imperador Tito, no ano 70, fugiram para a floresta, onde foram quase todos aniquilados pelos romanos.
Jesus, por ser um “revolucionário” em relação à ordem imperante, foi, àquela época, considerado por muitos como fazendo parte desse grupo.
Segundo alguns, a palavra essênio é derivada da palavra hebraica "Asa" e da palavra síria "Assaya" que significam médico, pois curavam a mente, a alma e o corpo. Estavam intimamente relacionados aos terapeutas, pois a função destes era também curar, além de transmitir os mistérios. Diz Josephus que estudavam as virtudes ocultas das plantas e dos minerais.
Segundo outros, a palavra provém do egípcio "Kashai" que quer dizer secreto. No grego, a palavra para secreto é "Essaios ou Esseno".
Os essênios se constituíam em uma misteriosa Sociedade Secreta em Israel. Edouard Schuré diz que havia duas comunidades principais: uma no Egito, às margens do Lago Maoris, ou Moeris, e outra na Palestina, em Engaddi, no vale Achor, o atual Busquis, entre o Mar Morto e Jerusalém e que, nesses lugares, se estabeleceram por séculos sem conta. Eram uma ordem de homens e mulheres virtuosos, que viviam vidas de ascetismo, passando os dias em trabalhos simples e as noites em oração. O Talmud[5] afirma que prestavam juramento e o cumpriam mesmo que custasse a vida. Fundamentavam-se em dez artigos de fé e, a meu ver, o mais notável dos artigos é o oitavo: "Manter-se silencioso em disputas, fechar os olhos diante do mal e tornar-se surdo às blasfêmias". O objetivo seria o de não polarizar, não criar contendas.
É curioso que os essênios não sejam citados na Bíblia. Os únicos escritores antigos que fazem referência aos essênios são apenas: Philon de Alexandria (13 a.C. - 54 d.C).. Plínio, o Velho (23-79 d.C.), Flavius Josephus (37-100 d.C.) e Plínio, o Jovem (62-114 d.C.) que escreveu "O Mistério da História". Registramos a seguir algumas de suas opiniões:
- Plínio, o Velho, que serviu como soldado romano na Palestina tornando-se, posteriormente, um dos autores mais produtivos da antigüidade, em seu livro "História Natural", diz que a comunidade dos essênios encontrava-se na margem oeste do Mar Morto, exatamente onde foram encontrados os remanescentes da comunidade de Qumran.
- Flavius Josephus, em seus livros "História Antiga dos Judeus" e "As Guerras Hebraicas", conta que, na idade de 16 anos, quis conhecer bem as doutrinas dos saduceus, dos fariseus e dos essênios para poder escolher a melhor. Depois de se aprofundar nas três, passou três anos no deserto com um asceta dos essênios, por nome Banus, visitando vez ou outra a comunidade de Qumran. Ele a descreve como uma sociedade formada apenas por homens, totalmente dedicada à agricultura. O ponto central da vida comunitária era a refeição conjunta constituída por pão e um prato de comida. Interessavam-se pelas profecias, medicina, estudo das ervas medicinais e das qualidades das pedras. Vestiam-se de branco e respeitavam o "shabat"[6]. Por terem alimentação harmoniosa e saudável, viviam cem anos e até mais.
- Plínio, o Jovem, diz deles: "Uma raça a mais extraordinária de entre todas as deste vasto mundo".
O jesuíta e teólogo francês, Padre Jean Danielou, cardeal de Taormina em 1969, acredita que, se os essênios não são jamais citados nos evangelhos, a razão parece ser a de que, para Cristo, eles correspondem aos "Verdadeiros israelitas, aos pobres de Israel". Outros dizem que estão resguardados sob as designações "Homens do Conselho de Deus" e "A Comunidade da Nova Aliança". Há quem afirme que, ao tempo em que foram escritos os evangelhos, as grandes guerras que se desencadearam nessa região, por volta de 476 a 1453, forçaram as comunidades essênias mais aparentes a se ocultarem.
Segundo Helena Petrovna Blavatsky, eles adotavam muitas idéias e práticas do budismo do oriente. O termo "irmão", por exemplo, provém dele, sem dúvida, e passou, depois, a ser empregado pelos cristãos, desde o inicio do cristianismo.
Schuré confirma esse orientalismo dos essênios após estudar seus métodos de oração, meditação, jejum e castidade.
Flavius Josephus, que lutou pela liberdade da Palestina e participou ao vivo da história que escreveu, diz: "Pregam a imortalidade da alma e acreditam que a alma, descida do mais sutil éter, e atraída ao corpo por um certo encanto natural, nele habita como numa prisão; liberta dos laços do corpo como duma longa escravidão, ela alegremente voa". E continua: "Eles julgam que se deva lutar desesperadamente pelas recompensas da retidão. Mesmo que o curso de suas vidas fosse melhor que a dos outros, ainda assim consagravam-se à economia. Adotavam a vida comunitária. Os bens eram reunidos e regidos por curadores.
Schuré confirma dizendo que nunca se tornavam comerciantes ou mercadores. Mantinham-se através da agricultura, da criação de carneiros e por habilidades de cerâmica e carpintaria. Os Pitagóricos, os essênios e os terapeutas acreditavam que as mãos se maculavam ao contato com o dinheiro. Eram considerados como a classe mais bem educada entre os judeus e há informações de que eram escolhidos para tutores das crianças dos oficiais romanos, em estágio na Síria.
Os candidatos só podiam se tornar membros da seita após um ano de provas iniciáticas e três graus de iniciação, que duravam nove anos. A comunidade dividia-se entre os celibatários e os que podiam casar.
Philon de Alexandria diz que eles consideravam o celibato como um estado superior ao do casamento porque o esposo, encantado pelos sortilégios de sua esposa, ou preocupado com os filhos por necessidade natural, não mais seria o mesmo em relação aos outros da comunidade e, pelo seu separatismo, se tornaria escravo e não um homem livre. Isto era contrário aos fariseus que recomendavam, de acordo com o Talmud, que se seguissem os caminhos da Terra. É por causa deste costume dos essênios que Jesus diz: "Há aqueles que se fazem eunucos pelo Reino de Deus". São Matheus 19:12.
Aqueles que se casavam, o faziam apenas para ter filhos.
Um detalhe muito interessante liga Jesus às práticas dos essênios. A seita dos essênios não se integrava nas atividades do clero e do Templo. Não participavam do culto oficial porque não aceitavam o calendário lunar adotado pelos judeus depois do período de predominância helenística, pois permaneciam fiéis a um velho calendário solar, segundo o qual, todas as festas caiam num dia fixo.
Uma erudita católica, Annie Jaubert, demonstrou em seu livro "A Data da Ceia" que Jesus obedecia o calendário de Qumran, que era o único divergente do adotado pelo Templo. A mais importante cerimônia dos essênios é exatamente a da ceia, que era presidida por um sacerdote, reservada apenas aos iniciados e que exigia a participação de pelo menos dez pessoas. O sacerdote benzia o pão e o vinho, como que prefigurando o grande banquete Messiânico que marcaria a chegada do Reino, do Messias por eles esperado. O ceia cristã é objetivação daquilo que o banquete essênio prefigurava. A ceia dos essênios remonta a Abraão que, por sua vez, a recebeu de Melchisedech. Gênesis 14:18 - "E Melchisedech rei de Salém, trouxe pão e vinho; e era este sacerdote do Deus Altíssimo. E abençoou-o e disse: Bendito seja Abraão do Deus Altíssimo, o Possuidor dos céus e da terra".
Em documentos bem antigos, os essênios previam dois Messias - um Sacerdotal e um Rei. Os ocultistas de hoje acreditam que Jesus deveria ter instalado um governo Sacerdotal com João Batista e um governo Temporal com Jairo. Isto não foi possível porque a humanidade não havia alcançado um valor que a fizesse merecedora desse acontecimento.
Uma coisa é certa, Jesus conhecia os essênios. João Batista, segundo a maioria dos exegetas, teve contatos diretos com Qumran antes de se transformar no profeta solitário. Estavam espalhados por toda a Palestina e eram hospitaleiros entre si, por isso vemos Jesus viajar seguro dessa hospitalidade.
Ernest Renan (1823-1892), historiador e filólogo francês, com toda sua incredulidade em relação a Cristo, afirma que o cristianismo é um essenismo que vingou.
Na revista Dharana 23 p. 9, o Professor José Henrique de Souza, comentando um dos manuscritos do Mar Morto[7] para cuja decifração faltava uma palavra diz: "Jesus esteve aqui entre os essênios".
Um dos grandes empecilhos para a tradução e divulgação desses manuscritos é o medo de que a verdade venha a alterar as crenças instaladas dentro do cristianismo.
Através das traduções dos manuscritos de Qumran, pôde-se concluir que existiam semelhanças surpreendentes e impressionantes entre a Igreja Cristã dos primeiros séculos, em Jerusalém, e a comunidade de Qumran, no Mar Morto.
Estava, assim, colocada a questão: teriam o cristianismo dos primeiros tempos e a comunidade dos essênios sido dois ramos de uma só árvore, ou se constituiriam em um único e mesmo galho?
O argumento mais forte para defender o caráter essênico de Jesus é postulado por Ucton C. Ewing, arquiteto, escultor e estudante das religiões mundiais, em "O Cristo Essênico" de 1961, e "O Profeta dos Escritos do Mar Morto" de 1963.
Ewing aponta os seguintes fatos:
1. João Batista viveu desde pequeno no deserto, onde os essênios o criaram. A ordem de Isaias para "preparar o caminho do Senhor no deserto" era um texto favorito de João e da comunidade de Qumran. O batizado era um ritual dos essênios.
2. Os ensinamentos de Jesus sobre verdade, justiça, pobreza e o Reino de Deus são tipicamente essênios. Os saduceus e fariseus são acusados por Ele, mas não os essênios.
3. Jesus se hospedava sempre nas casas comunais que os essênios tinham em todas as cidades. Segundo Mateus e Lucas, Jesus disse aos seus discípulos que nada precisavam levar em suas viagens, porque dinheiro, pão e roupas lhes seriam dados por pessoas dignas em todas as cidades.
4. A última ceia foi uma refeição comunitária, como a que os essênios costumavam fazer.
5. A última ceia aconteceu numa quarta-feira, o "shabat" dos essênios. Os essênios não tinham, como os fariseus, um calendário solar. Já que Jesus morreu numa sexta-feira, a última ceia não podia ter sido uma festa judia tradicional.
6. Jesus aconselhou seus discípulos a usarem apenas roupa branca, também uma característica dos essênios.
7. O nome João, o Justo, irmão de Jesus e líder da primeira igreja em Jerusalém, é um nome comum entre os essênios.
8. O quarto evangelho, o de João, parece-se, no seu estilo, tema e uso de linguagem, com os escritos de Qumran. Nos dois encontra-se um dualismo ético, com seus aspectos mais importantes: luz e escuridão, amor e ódio, vida e morte.
9. A Igreja primitiva falou de si usando a palavra "edah", o mesmo termo usado pelos essênios para indicar sua comunidade. A organização cristã de doze fiscais e três líderes era uma duplicata exata da constituição do conselho dos essênios.
10. Os primeiros cristãos não possuíam dinheiro individualmente, mas coletivamente - Judas administrava as posses coletivas da mesma forma que os essênios.
11.A Igreja de Roma tentou esconder as origens de Jesus ligando o nome Nazaré à cidade onde, supostamente, deveriam morar seus pais, em vez de ligá-lo com uma comunidade essênica na Galiléia, que tinha aquele mesmo nome, cujo significado é "messianista". Na Terra Sagrada não existia, até a Idade Média, nenhuma cidade com o nome de Nazaré.
Por sua vez, Helena Petrovna Blavatsky em "Isis sem véu", I vl. p. 26, diz: "Quando levamos em consideração que os Gnósticos, ou cristãos dos primeiros tempos, eram apenas seguidores dos antigos essênios, este fato não nos deve surpreender". Ela faz uma correlação entre as duas doutrinas, afirmando, por exemplo, que os Nazarenos, discípulos dos essênios, pregavam: "Entra em teu quarto, fecha a porta e ora ao Pai em segredo". Em São Matheus 6:6: "Mas tu, quando orares, entra em teu aposento e, fechando a tua porta, ora a teu Pai que está em oculto".
No inicio do século vinte, os espiritualistas passaram a aceitar que Jesus era um membro da comunidade dos essênios. No "Evangelho de Aquárius" de 1908, escrito por Levi Dowling, Jesus é apresentado como membro de uma seita secreta, sem nome, que desde o seu nascimento preparou sua missão.
No livro "Cristianismo Esotérico" de 1901, Annie Besant diz que Jesus foi criado numa fraternidade de essênios no deserto do Sul da Judéia. Depois de sua iniciação, Jesus achou que havia chegado a hora de transmitir a sabedoria - até então secreta - para o povo.
[1] Em 1100 a.C., Omri, rei de Israel, percebendo incursões dos assírios, comprou a colina de Gerizim, construiu Samária, e fez dela a capital do reino. Lá se encontra o túmulo de João Batista.
[2] Sião, em hebraico Zion, nome de uma das colinas de Jerusalém. Nela havia uma fortaleza que foi capturada por Davi, conforme II Samuel 5:6 a 9 e, por essa razão, passou a ser chamada "cidade de David". O templo que foi construído sobre essa colina passou a ser chamado Sião - Isaias 10:12. Depois, a palavra Sião passou a designar toda Jerusalém, sendo que toda a nação de Israel veio a ser poeticamente denominada filha de Sião e, mais tarde ainda, veio Sião a tornar-se o símbolo da esperança que o povo judeu acalentava de um dia voltar para a Palestina. É por essa razão que esse movimento de volta recebeu o nome de Sionismo.
[3] Rabino - Doutor da lei judaica. No início do século referia-se aos mestres ordenados membros do Sinédrio e, posteriormente, se aplicou aos chefes espirituais das comunidades israelitas. Atualmente, refere-se sobretudo àquele que dirige uma sinagoga e celebra as cerimônias religiosas.
[4] Sinédrio - Tribunal dos antigos judeus, em Jerusalém, constituído pelo Sumo Sacerdote, pelos Anciães e pelos Escribas que se destacavam pela inteligência e cultura. Era uma assembléia composta por 71 membros, com supremo poder sobre questões religiosas e com algum poder sobre questões criminais ou administrativas, concernentes a uma tribo ou cidade, bem como em crimes políticos importantes.
[5] Talmud - literatura religiosa judaica. Compreende textos do século III a.C. a V d.C. É expressão da lei oral enquanto a Torá o é da lei escrita. São complementos. Compreende o Mishnah e a Gemara.
Nos adendos, veja detalhes sobre a “Tradição Hebraica”.
[6]. Shabat - tratado inserido no Mishnah, a parte mais antiga do Talmud, que formula as regras gerais do sábado judaico, relacionando 39 categorias de trabalho proibido.
[7] Manuscritos do Mar Morto - Documentos dos tempos pós-bíblicos encontrados em grutas perto do Mar Morto. A gruta mais importante é a de Khirbet Qumran, perto de Jerusalém, que foi descoberta casualmente em 1.947, quando um pastor procurava uma ovelha desgarrada. Seiscentos fragmentos de papiros mostram os cinco livros de Moisés, o de Juízes e o livro de Isaias em hebraico. Alguns desses escritos chegavam a ter sete metros de comprimento. Há citações claras a respeito da ordem secreta dos essênios. Alguns desses documentos pertencem à Universidade Hebraica, outros ao governo da Jordânia, sendo que muitos foram para os Estados Unidos. Grande parte desses documentos foram adquiridos pelo governo de Israel.
Só agora, passados mais de 40 anos da descoberta, Israel está permitindo a cientistas o acesso a esses documentos.
Descobertas interessantíssimas foram feitas durante as escavações em Qumran, que hoje é um deserto, mas em outros tempos foi um oásis. A comunidade tinha um edifício central com 124 lados, rede de encanamento de água, uma fábrica de cerâmica, sala de estudos, ferraria, padaria, moinho de trigo, lavanderia e um cemitério com mil túmulos, principalmente de homens.